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Para O que É Próprio do Ser Inumano ou Memórias de uma fragmentação

Apresentação



Antes dessa apresentação havia uma outra, que certamente o Delete cotidiano apagou, onde eu me desculpava continuamente por tentar fazer reflexões e ao mesmo tempo menosprezava a minha poesia. Ainda bem que se apagou.
Não costumo sair por aí dizendo oque é certo ou errado, e seria uma grande tolice minha tentar escapar às críticas retirando dos leitores mais ácidos a sua principal arma: o dizerem que não faço poesia.
Não desejo mais escapar de nenhuma crítica e nem ser sua vítima, no entanto, saibam que faço poesia. E faço não por que possuo a técnica mas sim por que a poesia me possui. E ela faz isto da mesma forma com todos os poetas, sejam bons ou mediocres, arrancando para fora de suas almas este grito de existência. E nesta surrealidade por onde navegamos, nos ensina a mascarar ou desmascarar a realidade encontrada, a humana realidade...Extrapolar essa condição, exatamente quando se volta para ela, é próprio do poeta.
Muitas vezes desvelar máscaras não significa desnudá-las e perceber o que existe além, tornando-se mais enriquecedor fazer com que sejam percebidas exatamente por assumi-las. Ao envez de mostrar que elas existem, simplesmente enfeitá-las, carregar nas suas cores, ampliar o seu próprio papel, dando-lhes até mesmo personalidade, buscando que elas mesmas se revelem - deixando explícito para todos o seu papel - e que compartilhando de nossa existência muitas vezes não podem - e nem devem - ser retiradas, exatamente por serem mais ricas e significativas do que a própria personalidade por elas reinventada. Paradoxal?! Não, nós produzimos as máscaras, mas são os olhos alheios que dizem o que elas são.
Cada vez que criamos uma máscara com o desejo de que vejam apenas o que gostariamos de mostrar, ou que nos percebam como gostaríamos de ser, é o olhar do outro que nos lê e relê, e o que ele vê não é o que queremos é o que pode ser visto por ele.
Por isso o grande espetáculo das máscaras, onde elas deixam de ser escudos para tornarem-se personalidades, nos reenviando um conteúdo altamente perturbador, nos metamorfoseando na sua própria projeção.
Nestas páginas encontram-se reflexões, escritos diversos, até então perdidos em alguma velha agenda, e poemas, algumas máscaras minhas, umas tão reais que custa-me crer que não sejam eu mesmo disfarçado de máscara de mim...


Para O que É Próprio do Ser Inumano













Poeira.doc
De andar só é que meus passos andam cansados. Fatigados por essa poeira de estrada eles tropeçam e erram por aí.... Não fique triste aquele que acha que este é um caminhar sem rumo, eu realmente não me importo, então não há tristeza. Só me importaria se não pudesse caminhar, se não pudesse lutar em batalhas inglórias e estúpidas, se não pudesse absorver corpos novos e frescos... Só seria triste se não estivesse vivo... Acho que dinheiro nem me faz falta, mas faz tanta falta a outras pessoas que elas vivem de dizer o quanto eu não tenho.
De ser errante eu não me canso, talvez fosse bom fazer um plano de saúde, mas que importa, se não se está doente?
A poeira que se deposita em meus cabelos parece propaganda de shampoo, óleo e sujeira...Lave seus cabelos com Espuma Branca! Espuma Branca, o melhor para a sua cabeça, esqueça as suas preocupações e use diariamente Espuma Branca, único que além de limpar refresca a sua cabeça! Babaquice.
Parece que dois mil anos de cristianismo tornou Cristo mais cristão, ele também não virá, não bastasse D. Sebastião e Alexandre, agora Jesus, ele também não virá.
Nem sabemos se queremos que voltem na realidade, talvez fossem uma desculpa para as nossas manhãs e para os nossos amanhãs. Gostariamos de vê-los voltando, não por que fosse importante, seria só para quebrar a rotina. Mas, quero dizer a todos. Escutem! Estou anunciando direto das muralhas de Jericó, diante do exército de Josué, eles não virão! Eles não virão! Amanhã será a rotina. O ônibus lotado nos espera. A canseira do fim de tarde, o sorriso amarelado da manhã. Eles não virão!
A única coisa certa será a sua cara no espelho lavando-se para mais um dia. Tão repetidamente, tão repetidas vezes, até que isto também não mais ocorra... aí realmente terá a certeza de que eles não virão, mas, que além deles ninguem mais virá! Preocupe-se quando a sua cara não estiver te esperando no espelho no dia seguinte. Preocupe-se quando aquele rosto que estiver lá não for mais o seu... Se não tiver que fazer barba, se não tiver que passar baton, preocupe-se, aí é o tempo de preocupar-se.... por enquanto compre shampoo Espuma Branca, você precisa dele. Eu não!
Assim, vou caminhando por aí, desaforado e desaforando. De que adianta ser rico? Não é bom, tem pobre demais neste país, é perigoso ser rico. Ser pobre é falta de originalidade. E ser Classe-média, é o que já sou, me cansa, o que quero é ser poeta, profeta, artista, anabatista, qualquer coisa que não tenha nome, para ninguem poder pensar sobre isto.
E quando eu for essa coisa, essa que ainda não sou, sem deixar de ser o que antes houvera sido, somado, multiplicado e redividido com o que quer que fique da memória de meus antepassados pesadelos, terei limpos cabelos (?).
Isto está parecendo escript de Blade Runner, ou qualquer coisa assim. Acho que nós desistimos de falar alguma coisa linear que valha realmente à pena, o medo de sermos comprometidos pela fala é tão grande, que gostariamos de ter um Delete para falas anteriormente ditas e que não fosse conveniente agora serem ouvidas. Ao inventor deste delete, todos os nossos Loas!









Só de pensar no tempo que se gastou... e nem precisava...
Nem precisava atravessar a rua,
engolir as cápsulas de tálio,
beber cicuta e desviar-se da bicicleta...

Não, nem precisava de tanto sorriso.
Nem de tanta dor e agonia...
O relógio que inútil conta horas para si mesmo,
e, nem sai do lugar...
A lua que não se vê em noites poluídas,
A chuva ácida que não se bebe...

e, nem precisava...

De tantos olhos, tantos faróis iluminando estradas
De guarda-chuvas abertos em noites de sereno
De andar pequeno, quando tolices fazemos...

Quanto tempo se gastou...

Colhendo aquelas flores de plástico
Alimentando leões de bronze de alguma biblioteca
Tocando música imaginária em instrumentos de mentira...

Essas mágoas, essas inutilidades cercam-me...
E nem precisava...culpa do tempo que se gastou...
E se gastou com tão pouco...
e, nem precisava...




À MORTE QUE VEM

Até que a morte venha com seus perfumes,
A espera invade uma alma incauta.
Sem foice, sem machado, ela vem...
Com seu hálito perfumado, com sua bandeira desfraldada.

Deita-se este corpo de quimeras amanhecidas,
Terra de soluções ultrapassadas e de desilusões malfadadas,
Na boca deste amor não estabelecido, ainda amado,
Túmulo de heras rendado, com flores brotoejicas brotadas.

Escamas de peixe imagético caem de mim
E são pétalas, de rosas, de flores, de lágrimas...
Que, de mote perfumadas, ressecam-se
Até que um toque de teu dedo hídrico restabeleça
o frescor original.

Vem cavalheiro errante, com sua foice
Ceifar essa morte que deseja minha vida...
Chegue antes dela, para que libertado,
Possa ainda deitar sonhos sobre sua existência
E amanhecer pecados esquecidos.
(31.01.95)







Não ouço palavras, nem verdades...
nem nada.
Fechado nesse meu segredo,
Acalentando na alma esse desejo...
Seguro uma brasa viva, que me dá calor e...
queima as mãos.

Até para o meu segredo fechei-me.
Escondo-o com tamanha força,
Que nem ele sabe o quanto está dentro de mim.

Não sei se aguardo o momento
onde essa brasa há de consumir-me,
ou se a abafarei enfim, e
terei cicatrizadas as mãos
e serei livre de não vigiar um fogo-morto.
(10.01.96)




A esperança é um pássaro fugidio...
Sempre voa quando nos aproximamos...
Meu pássaro, está assim, livre,
sem pouso certo...
Irá parar sobre uma árvore, uma cerca,
sei lá...
Mas, alçará vôo ao me aproximar.
Pode pousar sobre meu ombro,
e ouvirei - como o corvo de Poe -
os seus ais: nunca mais!
De sofrer até a esperança foge...
e de mirá-la distante é que atiro-lhe iscas,
para que de meu lado pouse,
ao menos lembrando a minha dor.
Voará em seguida, pois é ave de arribação...
Estará migrando por terras que, sei,
nem de longe meus pés hão de pisar.
11.01.96 ?




Encontrar todos os dias este silêncio...saber que as horas são contadas,
e os minutos, como o bater de espadas...
O ébrios sabem o caminho mas, adormecem antes.

Esperar você, é uma dor alegre, se vier... se vier...

Não sei se tudo isso não é uma falsificação da imagem,
uma mistificação de sonhos.

O pó que recobre meus pés, aguarda o teu beijo...

Tarda, no entanto...






Gritar, e saber talvez quanta dor pode caber neste pequeno peito...
e não sentir, e não saber de todos os ecos horrendos
deste bestial e desumano grito.
Calar, e fingir que não se extravasou em linhas, estrofes e rimas,
emudecendo, quem sabe o eco, que em si repete o erro.
Não sem desatino, caminhar pelas ruas,
como se os sinais vermelhos não nos dissessem respeito.
Cujo atropelamento asfáltico é, deste silêncio, intruso ato;
que sem barganha, sem troca, esvazia todo o sentimento no fingir
não ter.
E nas estratégias do asfalto, encontrar-se nas ruas, nas pessoas,
em seus olhos vagos e apressados...
E nada ter para lhes dizer. Nada.
Assinalar com meu corpo o asfalto, com meu sangue mais um
sinal vermelho... Para avisar meus companheiros de humanidade:
Que dor não cabe, que dor não fica, que dor explode, e aí, a gente grita,
e ninguém escuta...



De compreender o que o alcool faz pelo bem da humanidade é que vivem as minhas celulas,
Não têm muitos sustos com novas paixões,
desde que possam afogar num copo, de sei lá o que, todas as suas dúvidas.
E não adianta nenhum alerta quanto a dirigir embriagado,
Dirijo a minha vida e qualquer acidente não será mera semelhança,
antes há de ser verossimelhança
Assim, minhas celulas não discutem e aliadas umas às outras alegram-se em meio aos copos de cerveja.
Nem têm grandes sonhos porquê bêbados não se dão ao trabalho de terem pesadelos...
Não talvez, mas sim portanto, tenho em mim reservas de tranquilidade para praticar
dos males o que minha alma mantém, em si, o mais bem guardado segredo...
O de te amar, mesmo assim embriagado ou bêbado.




Um acento de cólera,
Uma gota de intratabilidade,
Outro tanto de agonia,
Mas, nada, nada de felicidade.

Essas trocas que Deus obra,
Tormentos, trabalho, euforia,
Mas, nada, nada de alegria.

Essa cantilena de saudade,
Opus 6 de Corelli,
K 486 de Mozart,
Mas, nada, nada de ingenuidade.

As imagens vêm e vão,
Buscam-se umas às outras,
E gota à gota, imaginação;
Mas, nada de materialização.

Só este minuto fugidio,
Ampulheta de saudade,
Escoando um sentimento, arredio?
Mas, nada, nada de santidade.

Ainda que houvera sorriso.
Dentes brancos e roupas rôtas,
Paliativos da vontade,
Mas, nada, nada de juizo e,
nem de serenidade.

Um pássaro voa, outro pousa...
E as cercas em arame farpado,
Que deixam ver aos olhos,
Mas, nada, nada ao corpo ousam.

Apenas esta imagem insistente,
Agonia de anjos, penitente?
Falácia, silêncio e repente,
Mas, nada, nada de...




São retratos mórbidos estes que pintam , são traços da morte,
Retratos esplêndidos, falêncios de fumaças descoloridas,
Lembranças guardadas, desvanecidas...
Falas não elaboradas, não pronunciadas, porém,
já esquecidas.
Tem corpo de bruma meu amado,
Tem corpo de onda, tem alma de rapina,
Pele de gazela, espírito de homem e sonho feminino.
Mórbidos retratos, calor de insuficiência,
Apagada adaga, espada fugidia,
Brasão-logomarca, atual toleimada.
Silêncio, revérbero, verborragia afásica,
Anestesia, anestésico, odor e fala.
Terror de retratos, de espanto, de prato, me janto.
Devoro-me essas consciências de coisas, de coisificação,
janto-me com garfo e faca, com sangue,
Carne crua, bife mal passado, passada sangria.
São fotos, fotografias, derivados adjetivos de imagem,
Sangue-sugas, párias, Bhramins redimidos,
Falas, falas, falas, falstaffs falsos...
Falstaffs Falsos. Engenho, cana, engenheiro,
Doce, açucar, diz, que me, ama...



De cantar, os poetas, jazem mudos,
em calma...transparência...
Um silêncio cântico, cândido.
De pernas lânguidas, olhos baços
e respiração sôfrega.

De cantar jazem mudos...
Exauridos de toda profecia
de sonhos; e inertes,
fumam ópio, entregues
Em sórdida cantilena.

Jazem mudos...
plácidos e esquecidos...
Malfadados, emaranhados e
lúcidos...

Mudos...
Repousando como pó sobre as
coisas; já não pensam, nem
sentem nada... mudos...
de cantar...jazem os poetas.
(22.01.96)





Renovar o fôlego,
Respirar imagens novas,
Identificar displasias,
aneurismas e cânceres;
Acordar, fumar, beber café,
alimentar uma úlcera...
Todo o ciclo reprodutivo
das idéias;
Recomeçar sempre...
É impossível estagnar
essa vontade de viver;
regurgitar e ruminar
essas lembranças de
um passado recente;
alimentar-se delas e...
continuar o caminho;
Sem direção, apenas
cuidadosamente, observando
oque surge à margem da estrada, e oque é logo
posterior ao próximo passo...
Amanhecer intermináveis
segundas-feiras; e acentuar
os is da existência...
(12.02.96)



As esperas são gotas de horas...Jamais desejadas, vêm sempre,
nos obrigando à tirar a teia de aranha do nosso pouco usado
bom humor.

Inventamos desculpas para quem se atrasa, e pensamos na condição
humana...Cinco minutos depois odiamos a humanidade e a causa do atraso.
Mais um pouco e temos a certeza de estarmos fazendo papel de idiota...
No entanto, se a pessoa chega, um intenso milagre ocorre e tudo se
esquece...

Mas, se não chega...então vamos para casa, ou para um bar, ampliar
a nossa reflexão sobre a condição humana.
Pobre homem, cujo simples passar de horas, pode alterar toda a sua
existência.




Por que a espera?
Se ela não é nem verdadeira
e nem enganosa.
Por que a espera, se ela é falsa, indiferente?
Por indiferença se espera; Indi-ferência - se espera.
Este espaço tardio entre Esperador e Esperado,
que não tem que ser preenchido; estranha espera - tédio?!
Desejos reprimidos?!
Nem verdadeira, nem falsa,
esconde um desejo de tédio,
laborioso e encardido;
fumaça silente de transplantes de fígado...



Vivemos todos para lamentar folhas mortas.
Somos os vermes que comparecem ao seu funeral,
e choramos como bem pagas carpideiras,
todas as dores alheias; que não sentimos,
que não vivemos, que ao menos amamos.

Um cortejo de minhocas para uma folha faria mais sentido;
Talvez haja sentido afinal, já que nos pintam sexos e conosco mesmos
temos filhos novos, arrancados de corpos gastos e antigos.
Um grande urra às folhas mortas, e que o vento não as leve,
que não atrapalhe nosso cortejo; onde a hipocrisia consigo mesma
se compraz!






De tabular a saudade é que as minhas linhas vivem...
Trocando de margem, errando letras, soprando pó de borracha,
Deletando versos, sofrendo angústias.
De calar sorrisos é que meus lábios vivem,
Fazendo muxoxos para a esperança, cuspindo indiferença,
Aliando-se - alienando-se - à desavença entre a dor e a alegria, e, quando choro, teimam em mostrarem-se sorridentes.
É de saudade que meu corpo se debate...
E se esquece em meio às chamas de um fogareiro a gás, e se suicida, e se levanta, e se aquieta, e começa tudo de novo, é de saudade...
De saudade que a primavera canta, que o inverno gorgoleja,
Mornos goles de cerveja (?), e que vinho não há.
é desta fatal ausência que todo o meu corpo perece,
E, quando anoitece, estrelas não há, e não brilham, e não fogem, e não cantam, e não poetizam, e não fazem de brilhar seus olhos...
Malditas feras que te arrancaram de meus braços,
Naquelas outras eras...onde andávamos agarrados tu e eu em égua de pasto.
Malditas: quimeras, geladeiras, refrigeradores e ventiladores,
Que em seus eletrodomésticos terrores, não previram a minha afasia de forno de microondas.
Tenho um tédio Circulador de Ar que suaviza essa falta que tua saudade me traz, aí finjo logo que te esqueço...
Tomo um refresco - vivo inteiro para recomeçar:
De tabular a saudade é que as minhas linhas vivem,
Trocando de margem, errando letras, deletando versos...
Detergente, detergente, detergente, angústia, saudade...
Deletando versos, péssimos versos, de saudade, deletando, deletrando, em desrespeito lírico, a tua bobagem, que me faz delirar por um ventilador de teto!







Só para ter vontade,
Porque se nada houver,
que reste o desejo...

Se o anseio não for, nele mesmo,
uma carência,
que reste a esperança de ter sido.

Só não pode haver,
amor completo,
fome satisfeita
e desejos realizados.

O Anseio já é meio encontro.








Todos os dias a minha esperança
é estar vivo até às seis da tarde.
Depois, será como o silêncio de
muitas águas tragando muitos rios, e
eu perdido por entre as trevas das estrelas.






Antes que a poesia se dilua,
em estrofes, versos, rimas e imagens;
Neste concentrado de saber poético,
Quero te oferecer uma flor,
apenas uma flor.
(um gesto
um sentido)



Estes teus olhos de estrela,
irão iluminar outros...espaços;
Esta tua boca de riacho,
irá umedecer e fecundar outras terras;
Que me importa isso,
Se não são para mim teus olhos e boca?
Que iluminem! Que fecundem!




Vou lutar ,
até que não sobre mais espaço
para minha alma, dentro
do seu corpo.

















Todos os dias insistimos em morrer um pouco, e o engraçado é perceber que quanto mais perto da morte estamos, proporcionalmente mais vivos nos encontramos.

Ontem eu tive um ato de coragem, desses que sempre se fica em dúvida se se fez bem ou não. O que espero agora é a reação: covardia, violência, ou simplesmente indiferença.

Não tenho um sonho tão nítido assim...
As imagens que vejo guardadas no meu arquivo, são sempre paráfrases...
Uma metáfora não substitui bem nada. Apenas palavras claras, imagens simples.
O povo rumina a verdade como se fosse um chiclete, até perder o gosto, depois cospe fora e aí quer bala.

É por isso que sou um emabalador de verdades, não pertenço a elas, nem elas a mim, vivo delas e elas por mim.
(10.10.95)




Se essa imaginação, além de coleção de imagens, não for um emaranhado de sonhos..., então algo se perdeu.

Nem adianta argumentar que uma e outro são a mesma coisa, estou bêbado - de existência -, e com ébrios não se dialoga, canta-se junto, sob a pena - se não o fizer - de limpar o vômito, porque está sóbrio.
(20.10.95)




Solo de Clarineta

Solo de clarineta, espantalho fálhico-ato!!
Pernoite, cadeira, açoite. E as vontades que soberanas,
sobejam sobras de falsas faltas fantásticas...
Aliterando alianças, problemas, poupanças...
Sem sonhos, sei se soubera saciados meus desejos...
no entanto,...vazio Industão; minha fala falha alfaias e candeias
e, de degeneração em degeneração, meus desejos deificam deuses doados do Dardanelos,
anseios e falsos - castelos.
Ainda que beijos beiços baços belos,
sejam selos, salas, saudades, sono-solo, e assim
as claras gemas-emas aves borboletas;
Fazem falsos fundos fálicos
para um solo de clarineta.








Quero essa métrica! Cuspa-me aquela rima!
Venda-me a tua alma! Hine-se este sorriso!
Para calar quantos berros humanos possa.
Pois onde estão verdades tão frescas?
Onde prazeres tão novos? Mentiras tão perfeitas?

Falastrão falaz é o poeta! Instrumentador perigoso,
de toda poesia cirurgião hábil...de língua afiada, ou
...açucarada. Deita mel, manteiga e fel ao pão das donzelas!
E não serão elas...Putas? Pudicas cadelas?
Ele de falo em riste, perigo constante
escrevendo lendas, com tão saborosa pena...

Esteta das tetas, arranca rancoroso leite...
E se deleta, quero dizer, deleita, em ardentes beijos.
E se não pudera à espera das formosas damas aguentar-se,
Arranja-se lá com um rapaz!
Que disso perfeitamente é capaz...deixa de ser poeta,
Agora é apenas Narciso o doente Iago,
Abandona a poesiae torna-se viado!


Quero saber quem tirou da minha boca a carne de David,
Quero saber quem se equivocou
em deixar-me assim só...
Vendo o resto da humanidade
avalio a injustiça da minha solidão.

Talvez eu seja menos humano
doque imagine.
(20.10.95)




Ás vezes, as lembranças que tenho são do futuro; não sei exatamente de onde vêm, e nem para onde vão; e para ser sincero “acho” que não me interessa. São imagens recorrentes teimando em driblar essa realidade presente, e como lembranças, releio essas imagens do futuro, como preciso, e depois as deixo lá, torcendo para a inércia das coisas me levar a atingi-las.
(20.10.95)





"Sou moralista; sujeito certinho...,
no entanto, o que não entendo é
porque teimo em escrever melhor, bêbado e fumado."

P.S. fumo cigarro de cravo - a posteridade pode equivocar-se.
(20.10.95)




"Só de farra quero pincelar de vermelho o nariz da Estátua da Liberdade, só na imaginação, para as pessoas não terem o prazer de vê-lo.

Essa gente mesquinha vive para o dia em que alguém quebre a sua rotina. Eu sou mais mau, mudarei o mundo, e elas não perceberão que isto aconteceu."
(20.10.95)




Peço licença à estátua de Apolo
para estar cansado...
Este pó que recobre minha pele,
Esta lamúria, cantilena de gemidos,
hoje só querem as mãos de um homem;
Preciso da massagem do seu corpo,
da compressão das suas mãos.
Ser possuído por ele, e encontrar em
seu peito, um descanso, de fumaça de
cigarro...hoje eu quero...entregar
minha canseira, para um abraço
que me recorde, que traga a
lembrança de mim, d'uma força
que não se apaga, nada esquecida,
reconfortada por outro corpo igual ao meu.
Hoje eu quero o incenso e o óleo, a Mirra e o ouro,
pois estou cansado, e desejo entregar-me ao deleite,
ao prazer de um homem, e dormir... e dormir...

Hoje eu quero este sono de morte, que sei,
perturba os vivos.
(20.10.95)




Não tenho nenhuma verdade nova para te dizer, apenas as velhas obscenidades de sempre.

E nem quero fazê-las contigo, ouça-as apenas, e depois masturbe-se em casa.

Eu não te quero, e nem a mim mesmo, ambos somos insuficientes para oque eu preciso.
(26.10.95)

Quero pegar num telefone e dizer-lhe todas as coisas que não deveria...
Não deveria insistir em ter pecados,
Não deveria insistir em ser puro e ingênuo...
Não deveria ainda assim querer...

Do alto de minha torre de vigia,
Devoro edifícios e respiro a transcedental fumaça
Fuligem dos escapamentos da avenida que abaixo flui,
Como um rio caudaloso, que aos poucos afoga
puxando para o fundo...

E enquanto o sol se põe, do lado oposto,
Sem que eu possa vê-lo afinal,
Tudo o que tenho é o desejo insano de ligar...
Para ouvir todas as desculpas que já conheço, e mesmo porque...
Tentar é tudo quanto posso.

Outras janelas me observam, e fico calado
Diante destas favelas aéreas que estendem seus varais de roupa pelo espaço,
São estas desfraudadas bandeiras, acólitos de ilusão,
que trazem gravadas todas as asneiras,
que neste momento de canseira, desejo dizer-lhe ao telefone...

Rezo, e Deus diante desta súplica, deixa de mim distante,
Onze andares o telefone público...
E assim entre andar de elevador e humilhar-me no fio
Faço poesia impedindo-me de sonhar mais uma
comédia...


Quero te atirar a rede de informações,
Atropelar-te com a Super Rodovia,
E te amar vertido numa imagem de Coca-Cola,
Confundidos numa propaganda da Triton, onde todos choram.

Te quero produto de minha fábrica,
Bem ou mal acabado, o importante é ter-te industrializado.

Preciso de você Kitch, cibernético e
Informatizado; e abstraídos neste
abraço de "Win Wenders", te quero mais Punk, menos
colorido.
Perdido em meu abraço de neon.
(27.10.95)



















Não direi nada se me pedires,
Essa voz que soube antes,
Cantar tantos desatinos, é um
Feliz silêncio, se quiseres.

Sei que continuarei como as gralhas...
(31.10.95)


Estou tornando-me um devorador de almas,
nem os corpos me interessam mais, apenas
turvar a frágil placidez das pessoas, enlouquecê-las,
rodopiá-los e dar-lhes um empurrão, para que sigam a direção de seus desvarios.
(06.11.95)




Os desenganos não passam de piadas sem graça contadas por alguém cheio de boas intenções. Aí, você é educado e dá uma risada amarela, enquanto tentam consertar as coisas.
(08.11.95)



Há esperança
nem ponto, nem reticências,
nem exclamação, nem nada
(16.11.95)




Vou me contar todas as mentiras de sempre,
ver se consigo me enganar...
Que dúvida tola, a gente só não consegue
viver com a verdade, a ilusão é o espaço por onde nos movemos.
(21.11.95)



Quero corromper este teu corpo de menino...
viciar a tua alma neste vai-vêm das minhas coxas...e,
enfim, te mostrar e aprender contigo, que só os pecadores podem ser redimidos.
(sic).
pelo prazer redimidos!
(21.10.95)









Esmagar os sentimentos como um cigarro abaixo dos meus pés, esta era a minha vontade, mas ainda não fizeram solado grosso o suficiente, através do qual eu não me queime!
(27.12.95)




"Já repararam como os pardais são gordos?! Eles devoram os outros passarinhos."
(21.11.95)


"A falta de ética de minha geração não me surpreende; o surpreendente é saber que existem pessoas que se preocupam com isso."
(21.11.95)



"O tempo tem ilusões
que só a matéria pode
transformar em realidade."
(16.11.95)





"O que me incomoda é que os teus pés já estão sujos pela manhã."
(08.11.95)



"Vêm em levas, como filhos protegidos de Satã e não é paradoxal que queiram fazer o bem."
(27.10.95)



Tantas frases boas num só dia seriam o desejo de Shakespeare, se tivesse existido; mas, ele não existiu, foi só o sonho de algumas obras primas, que estavam abandonadas ao relento do sono da humanidade.
(20.10.95)





Un quantun de esperança
é o granulun de
un factun.



O castigo de Deus,
é ter se apaixonado
por sua obra.
É de amá-la e
odiá-la que vive
e se mantém.




DECRETO


A partir do dia de hoje quero decretar o fim de toda adversidade! E, assim, por decreto que ninguem mais sofra!
Não sou o Rei?! Tanto melhor pois que já não há mais súditos!
Então como o não-Rei proclamo para os não-súditos que não sofram! Que ignorem os peditórios dos famintos, que ignorem sua sede e fome. Façam vistas grossas para as penas de amor. Contornem as ordens dos pais e dos países.
Proclamo o fim da lamúria, das lágrimas que não puderam ser secadas, das dúvidas que não puderam ser respondidas, das dores de cabeça e desta forma também o fim dos analgésicos.
Proclamo o fim da morte e também o da vida se em adversidade ela tornar-se.
A partir do dia de hoje todos serão adultos, para que isso diminua o prejuízo emocional de muitos. E, aos não-súditos, permito gozar de toda felicidade terrena e celestial e se o inferno os satisfizer, assim também o seja.
E diante das críticas que sei receberei dos infelizes, proclamo desde já que todos eles deverão ter um companheiro(a) sado-masoquista a seu gosto e se ainda assim, passado todo o tempo que tiver que passar, alguém desejar: derrarmar lágrimas pela dor alheia, ter compaixão de si e da humanidade, fazer poesia como Cecília Meireles, proclamarei que a adversidade volte, para que ninguém pense que algum dia desejei a infelicidade de alguém!
Que se faça ouvir essa proclamação pelo não-Reino, onde grassam as ilusões perdidas, afixem-nas nos postes de erros passados! Para que dessa forma um não-rei também possa encontrar felicidade...

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O inferno angustiante do desejo Hoje quero refletir sobre um assunto do qual eu deveria saber muito, mas confesso que quanto mais aprendo, menos sei e muito menos acredito. E infelizmente não estou sendo modesto e nem socrático. Quero abordar o tema a partir do ponto de vista de alguém que viveu em outra época e que nela tinha medos, necessidades e expectativas e principalmente, tinha um futuro pela frente com o qual sonhava, mas não sabia o que seria deste tempo. Assim que eu disser a palavra, as pessoas irão abandonar a leitura, imaginando que “lá vem mais um falar do mesmo...” Confie em mim e apenas continue lendo, hoje irei falar sobre as necessidades, emoções, expectativas, vitorias e frustrações dos homens que gostam de homens.   Se não usei o termo socialmente aceito é porque de alguma forma ele está carregado de ideias e informações nem sempre corretas ou interessantes. Pode ser que eu o use mais tarde, mas por ora não.             Acredito que neste texto falo, sobretudo,

Deus - I O Devorador

  Deus me seduzindo            Esse não é um texto para relembrar o passado, mas uma tentativa de descrever o que não pode ser descrito.  Vou meter-me a falar do que não sei. Talvez seja exatamente assim, conhecemos muito e desconhecemos muito mais aquilo que realmente é importante. É como mãe, amamos muito mas às vezes nos damos conta do quão pouco a conhecemos. Entretanto, Deus, como o conheço, foi definido magistralmente pelo poeta indiano Rabindranath Tagore: “Sou um poeta e meu Deus só pode ser um Deus de poetas”. Então, só quem vive profundamente o ser poeta consegue traduzir em si o que isto significa.             Por aproximação tentarei dizer um pouco sobre isso. Uma definição destas não aparece em nosso coração na infância ou na puberdade, surge apenas quando ocorre um amadurecimento íntimo, que não tem idade para ocorrer. Podemos ter uma epifania em algum momento, mas ela só se consolida ao longo do tempo através de outros momentos assim. É como um “dejavu” não tem importâ

Deus III - A sustentação essencial. O que é real? O que é realidade?

  Não dá para ilustrar este texto de forma adequada                 Há muito tempo atrás se alguém discutisse a realidade concreta das coisas e do cotidiano eu mandaria a pessoa “catar coquinhos”. Entretanto as experiências existenciais nos ensinam se permitimos. O tempo passou e tive vários aprendizados que considero importantes. Eles ajudaram a definir minha relação com o mundo e as pessoas. Nestas experiências, e vivências, passei a lidar com um real que é tênue. Perigosamente tênue. O risco de lidar com uma compreensão expandida do real e da realidade é perder o vínculo que torna as coisas entre nós inteligíveis e aceitáveis. Entretanto, não há nenhum caminho, místico ou não, que não passe pela discussão daquilo que nos parece óbvio, e obviamente verdadeiro, irretocável e irrevogável. Então, hoje vou refletir sobre a realidade física e social, vamos desmaterializá-la para só então, falarmos de imaginação. Mas usaremos a imaginação o tempo todo como método para essa discussão.  

Deus II - A dança: Som e fúria

O sagrado pode se manifestar no cotidiano              De todas as coisas sensórias que me envolveram desde sempre o som é uma das mais fascinantes. Trago grudado ao espírito o canto da pomba “fogo apagou” envolto pelo silêncio da fazenda, ambientando a solitude do jovenzinho que sentava-se na improvisada jardineira da avó e olhava longamente para o campo. De um lado o pasto a perder de vista e de outro o cafezal assentado no morro. De um pouco mais distante vinha o som do vento assoprando forte nos eucaliptos, só quem ouviu esta melodia que rasteja pelos ouvidos e dá profunda paz sabe como é a música e o perfume que juntos vem e quando junto deles estamos ainda toma nossa pele a sombra fresca do “calipial”.             Trago no espírito meu pai assoviando. Era um tempo onde os homens assoviavam, e fazer disso uma arte também era parte do seu quinhão. Só com o tempo eu saberia que o som nos afeta fisicamente antes de nos afetar o espírito. O som toca o nosso ouvido, toca fisicament

Os homens, a história não contada. A pornografia e as transformações sociais da AIDS - II

  (Continuo aqui o texto anterior. Passaremos incialmente pelos anos setenta, a televisão e suas influências e chegaremos aos poucos até os anos 90 e as profundas transformações sociais e sexuais que ocorreram na sociedade). Começavam os anos 70 e éramos apenas amigos! Uma das coisas que me passavam pela cabeça quando era menino (05/07 anos) é que eu deveria ter nascido mulher. Mas isso ocorria não porque eu desejasse os homens, mas porque eu era, desde aquela época, bastante caseiro e não queria sair de casa e nem ver pessoas. Depois aprendi a ler e tudo o que eu queria era mais silêncio e menos pessoas. Depois veio a música e aí eu queria ainda mais silêncio e nenhuma pessoa. Mas para um homem essas coisas não eram possíveis. Homens deveriam ficar o dia todo fora de casa trabalhando e fazendo coisas que não gostavam, pois era necessário para sustentar a casa. Então, o Luizinho queria ter nascido mulher para ser “sustentado” e ficar em casa. E eu não achava a vida doméstica tão terrív