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Deus III - A sustentação essencial. O que é real? O que é realidade?

 

Não dá para ilustrar este texto de forma adequada


                Há muito tempo atrás se alguém discutisse a realidade concreta das coisas e do cotidiano eu mandaria a pessoa “catar coquinhos”. Entretanto as experiências existenciais nos ensinam se permitimos. O tempo passou e tive vários aprendizados que considero importantes. Eles ajudaram a definir minha relação com o mundo e as pessoas. Nestas experiências, e vivências, passei a lidar com um real que é tênue. Perigosamente tênue. O risco de lidar com uma compreensão expandida do real e da realidade é perder o vínculo que torna as coisas entre nós inteligíveis e aceitáveis. Entretanto, não há nenhum caminho, místico ou não, que não passe pela discussão daquilo que nos parece óbvio, e obviamente verdadeiro, irretocável e irrevogável. Então, hoje vou refletir sobre a realidade física e social, vamos desmaterializá-la para só então, falarmos de imaginação. Mas usaremos a imaginação o tempo todo como método para essa discussão.

                A primeira coisa que precisamos fazer é distinguir entre aquilo que você chama de realidade e o mundo natural (realidade vs. Mundo natural). Normalmente acreditamos que o mundo natural seja aquilo a que chamamos de realidade. Mas este é o universo todo como ele se apresenta “sem nós”, essa é a forma mais fácil de entendê-lo. Imagine um universo sem nossas definições, conceitos, palavras, imagens, construções e ideias sobre o mundo e a matéria. Difícil, não é?! Essa é a forma mais fácil. Podemos nos colocar numa posição de espectadores antes do momento de Deus dizer “Faça-se a luz!”, supondo que ele disse. A luz, nesse caso não é a que vemos, mas é a razão que nos informa e faz olhar para o mundo como se ele fosse igual para todos.

O mundo natural é o lugar que nos fornece informações sensoriais. Nós captamos fisicamente essas informações com os limites que nossos organismos possuem e as enviamos para o cérebro. O mundo natural nos fornece muito mais informações do que podemos efetivamente alcançar, elas se perdem por causa das nossas limitações. Limites físicos são o que mais possuímos. Nossos recursos sensoriais (tato, olfato, visão, audição e degustação, e os outros dois que definem os dados externos e internos do corpo para o cérebro), são muito mais limitados do que os de milhares de espécies de animais e insetos. Logo, conseguimos processar um número menor das informações que o mundo natural proporciona. E estabelecemos nossa relação com ele e com as pessoas através deste número menor de informações processadas; e elaboradas em experiência e consciência. Muitos já assistiram seriados na TV sobre como o mundo é visto e percebido por outras espécies. E os diversos efeitos visuais e auditivos criados para estes ensaios documentais ajudaram a recriar e dar uma vaga ideia do que estas outras espécies percebem do mundo natural, que tipo de informações elas recebem e como as processam.

Quando alguém afirma que a audição dos cães é dez vezes mais acurada que a dos humanos, nós não conseguimos saber o que é isso, pois não podemos vivenciar essa experiência. Não conseguimos nem imaginar o que seja essa imersão num mar revolto de sons - que deve ser sufocante para um humano. Daí já notamos que a experiência de “real” do cão é diferente da nossa. O cão também sente as variações de temperatura com intensidades diferentes - então ele deve ter seus infernos particulares. Seu olfato é assustador, já imaginou os sons acompanhados dos seus respectivos cheiros?! Numa lambida na sua mão ele evitou uma longa conversa de “como foi o seu dia?!”, pois com a língua analisou tudo. Isso apenas para falar rapidamente de um ser que está sempre perto de nós. Ele vive conosco, mas em outra realidade. Às vezes quando o cão, ou gato, faz caras estranhas para o vazio ou tem reações que nos parecem peculiares, pois não vemos e nem ouvimos nada naquele instante, ele está simplesmente vivendo a realidade que consegue receber e elaborar mais informações do mundo natural. Se isso é um pequeno exemplo da realidade de um cão, imagine a de uma galinha, uma vaca, um leão, uma formiga, uma abelha. Cada um deles vive numa realidade própria da sua espécie; e ainda que muito diferente da nossa elas são concretas e sólidas para eles. E as vivemos juntos, todos ignorando as realidades uns dos outros.

Entre nós mesmos existem outras percepções de realidade que encaramos como deficiência física (e aqui fica um questionamento). O cego lida com uma experiência sensória e do mundo diferente da nossa. E nem adianta fecharmos os olhos para dizer que sabemos o que é isso porque não é tão simples assim. Os surdos não vivem exatamente num mundo sem sons, pois muitos sentem vibrações e percebem alguns ruídos. Ainda que vivessem num silêncio absoluto, isto também seria uma experiência de realidade inteiramente diversa da nossa. E é muito comum que devido à surdez eles também expressem a mudez, pois não têm referências de como expressar os sons da fala. A simples sutileza de uma pessoa hipersensível sensorialmente, como alguns autistas e superdotados, já é suficiente para desencaixar este indivíduo de um bom acolhimento social. Os que vivem uma determinada realidade orgânica de recepção de informações do mundo natural sentem que os que não as recebem da mesma forma são problemáticos. Como são minorias o costumeiro era deixá-los de lado.

Essas circunstâncias de processamento de informações recebidas do mundo natural me interessaram desde muito cedo. Comecei a usar óculos aos onze anos de idade, e a minha visão caiu vertiginosamente. Quando tinha cerca de quinze anos já tinha 6,5 graus de miopia e 7,5 de astigmatismo no olho direito e algo parecido no olho esquerdo. Só passei a ver de forma padrão quando fiz uma cirurgia em 2014, aos 47 anos. Quando possuímos um grau de astigmatismo destes ao tirar os óculos não se vê exatamente o mesmo mundo que as outras pessoas. Ele se transforma num conjunto de pontos luminosos e coloridos. E os objetos passam a ser quase etéreos, pois seus contornos borram. A coisa que mais me incomodava era não poder me ver direito, nem com óculos e nem sem. Então cresci sem ter certeza de como eu era fisicamente. Mas o que mais me incomodava eram os filmes que mostravam pessoas que perdiam seus óculos completamente frágeis diante do mundo. Sempre eram pegas pelo assassino ou comidas pelo monstro. Essa não era a minha realidade. Acostumei-me desde cedo a tirar os óculos e a me mover por aí sem eles, para aprender a minha realidade visual. Meus ouvidos também parecem mais apurados por essa razão.

Este foi um fato fundante para mim. Ao colocar os óculos eu via o que todo mundo vê, ao tirá-los só eu via daquele jeito. Ao invés de encarar a experiência como desesperadora, eu achava lindo o mundo que só eu via. Ele era completamente real, irreal era o mundo que eu alcançava apenas com um instrumento, os óculos. Quando era rapazinho questionei a deficiência visual, pois notei que mais e mais pessoas não atingiam o padrão normatizado pelos oftalmologistas. Logo, discuti o saber cientifico que padroniza as coisas, e entendi que as pessoas vêm de formas diferentes, às vezes sutilmente diferentes; ou agressivamente diferentes. Também não joguei fora os saber científico.

E entendi, sem nenhum filosofo, que o mundo que todos concordam que é igual e real para todos não é exatamente assim. Pode haver outras percepções do mundo natural e elas são válidas; uma vez que são dadas para o nosso organismo da mesma forma que o são para todas as outras pessoas. E o nosso organismo é como é. O meu mundo visual era borrões luminosos e coloridos, e eles dançavam. E eu caminhava perfeitamente bem entre eles sem titubear. Só tinha as dificuldades óbvias da civilização, não era fácil pegar um ônibus, pois não via o que estava escrito na frente. Não conseguia ler sem óculos e distinguir coisas demasiado distantes. Mas era só isso. Dancei muito sem óculos. Afinal, a gente sua e eles escorregam e podem cair ou voar, ainda mais se a pessoa entra em transe dançando. O que posso dizer é que a partir dos meus onze anos o real passou a estar em questão para mim. Mas voltemos ao texto, após essa breve digressão.

Notamos que o real e a realidade estão diretamente relacionados ao organismo e a forma como este processa informações e lida com o entorno. Isto é físico. Não há como escapar disso. Mesmo que você consiga - como eu - relativizar esta experiência orgânica, ela ocorre. Ao falarmos com uma pessoa adulta sobre isso temos um patamar de conceitos e vivências em comum que nos permite garantir o status de real e de realidade nessa conversa.  O mesmo não ocorre com um bebê. Um bebê não nasce com a realidade pronta, ele nasce com os sentidos que o informam sobre o mundo natural (e como vimos, informam pouco). Nada garantirá que ele haverá de concordar conosco, exceto a sua educação constante. A prova do que digo são algumas crianças que por diversas razões foram criadas por animais, como o famoso Mogli, o menino lobo.

A história real foi bem pior do que a imaginação de Kipling, que encantou a estória. Uma criança que jamais tenha tido contato com humanos, será tão lobo quanto os lobos que a criaram, apenas sem as vantagens de um faro e audição superiores. Mas coçará suas pulgas e andará de quatro, e rosnará como fazem os lobos, atacará, caçará. Apesar da aparência não é humano. E se ele pudesse te comunicar o que é real e realidade, você saberia que ele vive num outro mundo. Jamais houve um caso de uma criança criada por animais que tenha conseguido sobreviver muitos anos após ser encontrada; e cujo processo de humanização tenha sido bem sucedido de verdade. Em alguns casos, conseguiram que meninos lobos falassem - mal e pouco -, mas era um lobo se comunicando. O humano não nasce humano, torna-se humano. Ele não aprende sozinho, é ensinado em meio à sua comunidade e ao seu desenvolvimento físico. Posteriormente este percurso do aprendizado, humano e social, é esquecido enquanto. Apagam-se os seus vestígios, ainda que algumas marcas se mantenham. Agora, preste atenção em algo importante. Um cão criado por humanos ainda é um cão, mesmo que tenha sido isolado. Ainda que tenha suas particularidades, ele agirá e continuará sendo um cão. Já o humano não.

Até então vimos falando da relação do nosso organismo com a realidade propiciada pelo mundo natural. Agora, vamos para a outra parte relativa à realidade e ao real: a formação da consciência e o consenso social. Neste assunto serei bastante breve para não atrair a fúria dos especialistas, porque farei isso de forma grosseira, pois apesar de saber como se dá não sou um expert.

Após o Bebê ser posto pra fora da mãe, ele passará aos poucos pelo processo de individuação; irá descobrir que não faz parte do corpo da mãe e que está separado desta. E estando separado desta, ele será aos poucos informado de quem é. E constituirá, a partir das suas relações com os objetos e as pessoas, o fato de que ele é um indivíduo. Aí chegamos ao momento do estágio do Espelho - acho que informado por Lacan -, onde o Bebê reconhece a imagem refletida como sendo a dele. Alguns animais rosnam para sua imagem, outros nem a conseguem ver. Mas humanos, depois de algum desenvolvimento, conseguem saber que a imagem é deles. Tenho uma pinscher que se reconhece no espelho também. E outras pessoas dirão o mesmo sobre alguns dos seus cães. Sim, também é possível para alguns amimais. Provavelmente sem o efeito restante, que é o surgimento de uma consciência complexa e elaborada.

É a presença humana, o seu contato e sua troca de informações, que possibilitam à criança se tornar efetivamente humana. Então, chegamos aqui a uma conclusão desagradável para algumas pessoas: o que faz uma pessoa ser humana não é seu organismo apenas, isto nada garante, mas o seu aprendizado de si e o social. É através de erros e acertos (elogiados pelos humanos adultos) que uma criança estabelece o que as coisas são, para que servem, sua utilidade e função. Começa a dominar algumas palavras que garantem que haverá reciprocidade na comunicação e suas necessidades serão atendidas. Seu comportamento instintivo, que é rastejar e pegar coisas e leva-las à boca, aos poucos vai sendo domado e educado (em alguns casos dá certo). É por essa razão que o mundo “imaginário” de uma criança, ou o mundo mágico, é diferente do de uma pessoa adulta. Na criança os limites entre o mágico e o real ainda não estão definitivamente estabelecidos. Mas isso não significa que tenha problemas ou seja insana. Aceitamos que é uma criança “e não sabe das coisas”. Aí chegamos ao ponto climático da nossa reflexão, o “saber as coisas”.

O conhecimento sobre o que a sociedade convencionou que é real e verdadeiro, concreto e não subjetivo, é o que chamamos de consenso social. Este consenso social nos diz o que é o real e a realidade. Enfim, ao adentrarmos conceitualmente para este nível mental estabelecido pela sociedade, fechamos a porta para outras realidades. Aceitamos o consenso social como sendo a realidade e o real os mais sólidos possíveis. Essa realidade do consenso é palpável, é inquestionável em nosso cotidiano. Nos movemos e tudo fazemos nela e através dela. Alguns leitores já notaram que as pessoas que estão admitidas no espaço do consenso social estão numa realidade mais ou menos fora do mundo natural. Elas estão para este mundo como estão as pessoas do filme Matrix, aquelas que estão conectadas à Matrix conformando sua existência a uma bolha de realidade.

Vivem numa realidade, um consenso social, feita para elas. Neste sentido, raramente conseguem ver ou se conectar a eventos que ocorrem em outras realidades. E se o fazem, estes eventos são assustadores e chocantes - defeitos na Matrix. Estão neste caso sons estranhos, aparições de todo tipo, visões, experimentações psíquicas, paranormais, etc. Inclusive, é da irrupção neste consenso social, daquilo que pode ser e daquilo que não pode ser, que vem o conceito de milagre; uma suposta ruptura da ordem natural. Claro, esta suposta ordem natural também foi estabelecida a partir das experiências sensórias dos humanos e dos seus métodos. Vez por outra esbarram na física quântica que atrapalha um pouco as coisas. E provavelmente o avanço humano esbarrará em algumas dificuldades enquanto o consenso social do real não for efetivamente levado em consideração nas pesquisas científicas (já o é em parte).

Não quero dizer que o estabelecimento da consciência humana seja um erro ou um equivoco, e que o consenso social deva ser abolido. Isto não é possível sem deixarmos de sermos humanos. Também não quero dizer que a consciência não atua no mundo efetivamente, ela atua. Entretanto, atua mediada pela baixa qualidade das informações processadas pelo seu organismo e filtrada pelo consenso do real, que inibe percepções verdadeiras, mas diferentes do que as esperadas. A plena formação do organismo, permitida através das relações sociais e psíquicas do indivíduo, garantirá a sua humanidade e o seu lugar nesta cadeia social. Por isso é importante a igualdade de oportunidades no que tange ao desenvolvimento dos corpos até a juventude.

Para refletirmos quero criar uma imagem. Pense numa vista aérea de um formigueiro e todas as suas formigas atarefadas exercendo suas funções. Agora afaste-se visualmente um pouco mais, coloque este formigueiro em meio a um jardim, o jardim em meio à cidade, a cidade em meio ao país, este em meio ao mundo, o mundo em relação ao universo. Nós somos estas formigas fechadas em si e na comunidade das formigas, para quem o universo não existe enquanto tal. Só vemos a nós mesmos, mas todo o resto existe. Existe mesmo sem sabermos o que é ou imaginarmos como pode se dar a sua existência. Essa é a pavorosa condição humana na terra. E ela é mais frágil do que a de um cão, que ainda sabe que é um cão na ausência de outros cães. E apesar de não sabermos exatamente como se processa o surgimento e estabelecimento da consciência e da individualidade, sabemos que ela é mais ou menos o resultado destas relações orgânicas que permitirão o sucesso efetivo de um corpo.

Em outras palavras, a consciência é decorrente da vida e provavelmente com ela cessa, ou cessa antes em alguns casos (Alzheimer). O sujeito, a individualidade, a consciência são como a secreção deste processo todo, um rejeito orgânico. Podemos encará-la assim ou de outro modo. O fato é que a existência da consciência é dependente do bom funcionamento do organismo e das funções psíquicas por ele propiciadas. Ao mesmo tempo em que a consciência é uma secreção do organismo ela é o suprassumo do que significa ser humano e através dela, e do conjunto das consciências, que atua e interfere no mundo e em todas as suas relações e processos.

O real e a realidade da forma como os conhecemos no cotidiano não existem. Existem e se manifestam apenas para nós que os construímos em meio ao mundo natural. Logo, por essência o real e a realidade são o mundo natural. Não conseguimos efetivamente alcançá-lo, mas podemos nos alçar nele em algum momento de ruptura do consenso social e da consciência coletiva. E adiantando, sem adiantar: Vivemos, como querem os indianos, em Maya, a ilusão, a suprema ilusão. É isto que é o consenso social e todas as suas consequências. Pisamos efetivamente no corpo de Brahma (mundo natural) de onde saem todas as coisas, como acreditam os antigos e modernos indianos. Não sou hindu e nem adepto do hinduísmo e nem seu profundo conhecedor - e também não o preconizo, mas “fala sério” estes caras são muito bons. Vez por outra sou obrigado a perceber as confluências. Deus III - A sustentação essencial de todas as coisas.

Só podemos estar mais preparados para lidar com o mítico e o sagrado ao relativizarmos e compreendermos a essência deste real cotidiano. Pois esta relativização pode evidenciar a sua existência e realidade próprias; das quais participamos e ao mesmo tempo estamos separados. Ainda que este texto não deseje invalidar a experiência do consenso social, que é minimamente necessária, ele chama a viver com a compreensão de que nos movemos num mundo mais complexo e que devemos derrogar o real para atingir o essencial. Essa derrogação do real, só pode ser provisória, caso contrário ela não tem volta. Pois haverá o momento em que você agarrará a realidade pelos cabelos e ela lhe escapará. A loucura de nada adiantará ao místico, pois isso impossibilitará a atuação da sua consciência no mundo de Maya. Só pode ser considerado místico por seus contemporâneos sociais porque faz a viagem de ida e volta, faz a passagem pela porta do consenso social do que é o real e por ela volta.

É por isso tudo que aquilo que você chama de real e de realidade, ainda que funcionais dentro de alguns limites, são apenas uma ilusão coletiva. Isso mantém as formigas ocupadas em suas funções e trabalhando no formigueiro. Entretanto, pode dificultar para que tenham uma mínima percepção do universo que as cerca e no qual efetivamente vivem todas as coisas.

 

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