Alguém que me ame, ao invés de fazer “sexo”. E esteja comigo, e não numa “performance
pornô”. E que goze, e não tenha “orgasmos”.
E que durma abraçadinho e não “de conchinha”. Que converse, e não “discuta a
relação”. E que seja um mero trabalhador, e não um “profissional” realizando
uma “carreira”. E que seja jovem, e não um “teenager”, “adolescente” ou “mlk”.
Que não tire fotografias, mas que se lembre de mim. Que não me mande “torpedos”,
mas flores.
E quando estivermos cansados, que descansemos, e não tiremos “férias”. E
se tivermos dificuldades, que sejam problemas e não “diagnósticos psicológicos”. Quando estivermos tristes, estejamos tristes
e não “depressivos”. Quero alguém que esteja vivo, e não procurando se
enquadrar em “categorias científicas”; querendo quem concorde com o seu
diagnóstico.
E se por isso eu ficar bravo, zangado mesmo, e em seguida ficar bem e
feliz, que não diga que sou “bipolar”, mas imprevisível, de lua, de veneta. E se
eu não for bom de conversa, não me chame de intelectual ou blasé, me chama de
chato, pois é o que eu vou ser.
Se eu ficar doente, que seja de banzo, maleita, lepra, amarelão e
espinhela caída... E se eu tiver com “micose” ou “herpes”, me benze de cobreiro,
isto irá bastar. Se eu perder um olho, me chama de caolho. Me chama de cegueta,
é melhor do que ser astigmático ou míope.
E tenho vista cansada, braço curto, mas não “presbiopia”. Que eu fique
aleijado e não “deficiente físico”.
Se eu ficar doente, que seja de amor, e não por não ter conseguido
repetir as categorias do marketing científico, social, religioso, artístico,
profissional...
E se eu comer demais, que eu não fique “obeso”, mas gordo, muito gordo. E
se por isso eu começar a beber. Me chame de bebum e não de “alcóolatra”.
E se o tempo passar, que eu não fique “idoso”, mas velho. E se eu não
falar coisa com coisa, me chama de gagá, e não diga que tenho “Alzheimer”, pois
gagá é mais divertido. E diversão não precisa de cura.
E se tudo der errado, e eu ficar só e abandonado, me chama de mendingo, o
homem do saco, e não de “morador de rua” ou “velhice desamparada”. E se você for me ajudar, me dê um adjutório e
não “Assistência Social”.
Quando morrer quero ser defunto, e não “corpo”. Quero morrer em casa, e
não num “hospital”. E quero que me chorem e que me bebam, e quando me
enterrarem, que as flores não disfarcem mais o mau cheiro. E se teimoso eu
voltar, podem me chamar de fantasma, assombração, “espírito desencarnado” eu não
quero ser não.
Sou pessoa e não “objeto de pesquisa”. Dispenso todos os nomes pomposos
que criaram para falar o que já bem sei. E em todas as “estatísticas” que
fizerem, apaguem um número, aqueles que vocês me deram... Não faço parte de
nada disso, nem das estatísticas “dos que não fazem parte”. E se tiverem de
debochar de mim por isso, me xinguem de viado e não de “homossexual”.
Sim, eu prefiro a sabedoria popular à ignorância científica. Ao menos a
primeira não nos separa. Ela escancara que somos humanos e iguais em nossas
diferenças. Já decorei todas as “falas”, todas as “fórmulas”, todos os “códigos”,
eu os sei, mas me recuso a repeti-los. E não venha me dizê-los para que eu te
compreenda a partir de conceitos alheios, prefiro teus erros aos acertos dos
outros.
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