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A Dor da Solidão

Quando a dor me procurou
Quando a dor me procurou,
disse-lhe: Estou ocupado,
deite-se ali!
Ela deitou-se em minha cama
e aguardou...

Quando a solidão me procurou,
disse-lhe: estou ocupado,
deite-se ali!
Ela deitou-se em minha cama
e aguardou...

Como eu tardava,
as duas devassas
entregaram-se...entregaram-se
dias e noites sem fim...
Quando enfim deixei meus afazeres...
lá estava o seu fruto sobre o meu leito:
a amargura.

Não era minha filha,
era filha delas,
no entanto, foi gerada em minha cama...

Quando invadido pela fome,
saí em busca de alimento,
eis que enfim chega o amor;
e não me encontrando,
deita-se com a amargura,
e nela faz um filho:
o desespero...
Agora que ele habita
a minha casa é inútil voltar.

Os CãesOs cães dormem,
dormem...dormem...
Não adianta dizer-lhes que a alvorada se anuncia,
nem tentá-los com alguma guloseima...
Dormem...exaustos,
Numa parte da noite latiram sem cessar,
trocavam mensagens entre si...
perturbavam o sono dos que lhes eram diferentes...
Rosnavam para a sombra.
Os artísticos uivos para lua jazem inúteis e perdidos...
Entre um resmungo e um ganido eles sonham,
Sonho de cachorro,
Meu Deus, que será o sonho de um cão,
Vagueiam pelo onírico universo Junguiano
Ou algum outro, criado pelas delícias do faro.?
Seguros de que ao despertar haverá ração,
aguardando, nos olhos cheios de piedade, neles postos,
a comida... ela virá.
Enquanto os cães dormem,
chega o ladrão.


Fermento da rotinaOuvir, todos os dias esse longo silêncio
que fermenta....
Essa surda atividade da rotina...
Este sepulcro encoberto e vigiado por fantasmas...
Ouvir e fazer ouvidos moucos, sabendo ...
Todas as agonias...sordidamente montadas, parte por parte...parte por parte,
repetidas e infinitas vezes
e,
ignorá-las.
para não enlouquecer.

Ás vezes pergunto-me:
Onde , meu Deus, a esperança para mim?
Se por saber, Deus faz, assim como eu,
ouvidos moucos,
ouvindo todo o silêncio
Dessas surdas atividades da rotina
E geme, todas as agonias... sordidamente montadas, maquinadas,
e,
Ignora-as,
para me enlouquecer.

É um jogo macabro:
Há quem muito foi dado,
Muito será tirado.
Resta saber quem pediu prá ter!
Resta saber quem tem o dom da renúncia, dom suficiente para esquecer...





O<strong> Preço da Diferença
Calam-se os desejos
Foram oprimidos...
Os incapazes de sonhar, de sorrir, de amar,

os incapazes...

Unidos eles são a sociedade
em separado não são ninguém.

Eu sou alguém sozinho
Se os aceito não sou ninguém.

Então...terei de pisar
nos calos dos desejos para que gritem
gritem, gritem....


Sorriso AssassinoO teu sorriso é como uma faca
Encanta, ameaça e mata.
Premia-me com teus lábios,
Dá-me teu corpo,
Empresta-me tua alma...
Mas te imploro: Não sorrias!
Se não estarei irremediavelmente perdido!

Tudo para mim...
Diga-me que és o perfume das flores,
o perfume e sua razão de ser.
Diga-me que és o vôo dos pássaros,
o vôo e sua razão de ser.
Diga-me que sem ti as águas não correm,
que os abismos não a s recolhem em seu bojo.
Convença-me que sem ti as brisas e os ventos cessam,
e que és, ao mesmo tempo: outono, inverno, primavera e verão.
Dilacera-me a alma e sem nenhuma dúvida afirme: sou a violência, a paz, a agonia,
a alegria, o medo e a segurança.
Não importa o quanto pareças soberbo,
mas olha-me e diga: Eu sou o volteio da Terra
e sua razão de ser.
Informa-me que se eu fugir de ti
te encontrarei no alto de cada monte que subir,
no fundo de cada vale que descer,
que não poderei olhar para o céu sem ver tuas estrelas e,
teu sorriso lunar rasgando o manto da noite,
e, revela-me, que és a noite também!
Fala-me dos desejos e prazeres de todos os corpos
que já estiveram, estão e estarão sobre a Terra,
realiza-os em mim!
E eu acreditarei em ti!
Sussurra-me uma última verdade: "a Terra gira em mim,
o sol está queimando em meu íntimo
e a via láctea são os meus dentes
e tudo o que está em mim,
tudo o que sou
realizei para entregar-te..."
Então...serei teu!
Só o Universo, o infinito e o eterno
podem trazer meu coração apaziguado...
Entrego em tuas mãos o pó,
que em essência sou,
Pois, para quem ofereceu tudo...
apenas o nada é bom complemento.


Amor PresenteEnquanto você me fala do seu medo,
Eu recolho minhas esperanças.
Enquanto tece suas expectativas,
eu afundo minhas perspectivas.
Quando você promete me amar,
Eu me esqueço que já te amo.
Enquanto você me conta a sua estória,
Eu emudeço e desconto a minha.
Quando você se prepara para um trêmulo abraço,
enrijeço e não mais me entrego.
Por que prá você tudo é amanhã, futuro;
e para mim só existe hoje, presente.
Se não puder ser agora
Não será depois.


Eu não sei quem você é...
Você diz que já foi para a cama comigo,
Mas eu não te reconheço,
você me diz que já me amou
e eu não sei quem você é.
Não se entristeça...
Os cemitérios são assim mesmo
Não reconhecem os corpos que neles se deitam...
Os que chegam até mim
já estão mortos...
Deles só quero o que se tem dos que se foram...
o silêncio, velas acesas e flores secas.


LiberdadeVejo esses meninos de rua,
meninos que nos incomodam...
Não importa o local: bar, loja,
shopping, cinema, o escambal...
Os seguranças intimidam, correm atrás...
a molecada faz pirraça
e ameaça...
E ninguém pode fazer nada mais.
Invejo essa agressiva liberdade.
Liberdade de criança mal-criada
que não pode ser castigada.


Poesia: apenas necessidade
Há força?
Se há, haverá também a fragilidade,
mas nem força nem seu contrário
Só ocorre a necessidade de que existam.

Há amor?
Se há, haverá também ódio,
Mas nem amor nem seu contrário
Só ocorre a necessidade de que existam.

Há mundo?
Se há, haverá também o não-mundo
Só ocorre a necessidade de que existam...

E a necessidade haverá?

Se ocorre a carência, haverá fartura,
Mas nem necessidade nem seu contrário
O que há é poesia
Poesia em todas as coisas...



Bebi do Babilônico Burburinho
Bebi do Babilônico Burburinho
da cidade...
Enquanto eram-me segredados silentes silêncios,
Vi o vôo, a vida do passante.

A alegre desdita de quem não viu um fato novo.
Assim, vem a cidade...
não como antes.
Mas, como quem traz outras verdades.
Bebe-se do burburinho
pelos ouvidos...vendo-se...
informando-se pelos olhos:
o outro é seu amigo.
(Esquinada Trajano com Felipe Schimidt)


Falsas forças fusas e fugazes
Sorve o silêncio
Cansaço, solve...
Deixa escorrer pelas suas brumas
as falsas forças,
fusas e fugazes...

Que em suas melenas,
Novas canções sonolentas
sejam compostas.
Deixa as frases contumazes
esquecerem-se
numa noite fraudulenta...
Até que brote entre flores pequenas,
o repouso...
e eu seja novamente
vento faceiro
e não, inexistente,
brisa calada.



AbutresAté que dia verei o desejo?
Esses olhos sedentos que caem
sobre mim...
Estas bocas modorrentas
que sorriem para mim...
Estes corpos suados
se insinuando para mim...
Até quando?
Até quando, eu passarei despercebido,
enquanto meu corpo ,
numa bandeja vem servido?
Quando não haverá mais carne suficiente para os abutres?
Quando?
Sempre haverá os que desejam mesmo os mortos.
Sempre há...
Geração torpe e parasitária,
Geração otária, perdida em barbárie
Eu a vejo
Eu a ela pertenço
Não sei se há limite para a seiva que as orquídeas sugam...
Não sei.
Nem me importo de ser triste
neste poema.
Havia tanto tempo não falava minha pena...

Comentários

Unknown disse…
Luiz, sem palvras pra dizer algo sobre seus poemas. Usei minha hora de almoço hoje pra ler o seu Blog para, dessa vez, alimentar a alma. Sinto me saciado por um bom tempo, mas inquieto pra alimentar-me mais de novos poemas seus. INCRÍVEL!
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