Sim, eu acredito no livro! Alguns
dizem que creem em Deus, mas eu creio no livro. Não vai aqui nenhum desprezo
para a tradição verbal e a experiência mística e as vivências sensoriais do ser
humano, não. Muito pelo contrário. Entretanto, a “tradição” há muito tempo é
passada por livros e sempre com a nota de rodapé que diz: “a tradição...” “O”
livro, e não “um” livro, foi o melhor suporte – como dizem hoje – encontrado pela
humanidade para passar seu conhecimento adiante. Conhecimento e tudo o que isso
significa: ficção, diversão, matemáticas, música, medicina, etc.
“Praticamente uma internet” você me
diria. Não, a internet é uma espécie de lago gigantesco, extremamente raso na
maior parte do tempo; em alguns lugares possui profundos buracos nos quais você
afunda e não volta mais. Suas águas plácidas e paradas têm pouco oxigênio e por
isso suportam apenas algumas formas de vida muito simples ou perniciosas e
daninhas. Os peixes mal conseguem respirar, ocorrem muitas algas, bactérias e
vírus não é novidade. Em meio a um deserto quente, inexplicavelmente este lago
de águas paradas, e praticamente podre, se mantém. E um monte de gente só
recorre a ele por jamais ter imaginado que há poucos quilômetros dali existem
rios de água fresca. Água viva, água verdadeira, rios potentes e profundos. Livros.
Tendo em vista a sua importância, o
livro até nos parece algo banal em nosso cotidiano. Entretanto, o concreto e o
tijolo também são banais e sem eles nada se constrói. E eu digo mais, só se
constrói e só há concreto e tijolos por causa dos livros que ensinam. O livro é
o repositório do saber humano, do conhecimento. Ele é fisicamente durável, é ao
mesmo tempo detentor da memória e das revoluções, contém passado, presente e
futuro. E, às vezes, quando menos se espera, eis que desenterram um Evangelho
apócrifo de dois mil anos para revolucionar e modificar o nosso presente.
Quando se trata de ficção é algo
espetacular, o livro é sempre novo para quem não o leu. E ainda mais
surpreendente, enquanto não lido as representações que ali são contidas nada
significam, até que sejam avidamente absorvidas, por um leitor ou leitora, e
passam para o mágico mundo da abstração e das idéias; voltando, assim, para o
lugar onde se originou.
Nossa civilização global está
sustentada pelos livros, nossas crenças – com tudo o que têm de bom e de mal -,
estão sustentadas nos livros: Os Vedas, O Talmud, A Bíblia, O Alcorão, O livro
de Mórmon, O Livro dos Espíritos, etc. Isto só para ficar na religião. Depois
temos os livros dos que não desejam a religião, e um dos meus prediletos é O
Capital (que não está preocupado com isso rs). Em outras palavras, o livro é ao
mesmo tempo repositório e veículo de idéias.
Até mesmo para um escritor é difícil
falar dele sem escrever outro. O Livro é a base material da abstração e do
imaginário. E não se enganem! Nossa vida, nossa sociedade parecem reais, mas só
o parecem por que são imaginadas. E no livro encontramos alimento para que esta
grandiosa fantasia que é a vida na terra se mantenha. Diferente daquele lago
quase estagnado citado lá em cima, o livro nos permite superfícies diversas e
profundidades inacreditáveis. Ele é cheio de vida, de vidas, de respostas e
dúvidas. A fauna e a flora explodem nele por todos os lados. Eles são cheios de
arte, coloridos, escritos e escrevinhados. E apesar de existirem em profusão,
você não pode lê-los todos e nem achar que os absorverá todos. Você precisa –
depois de alguma experiência – escolher.
E um livro, ao contrário de outras
facilidades por aí, não se dá facilmente. Ele exige que você se esforce, que o
desvende, e se construa e reconstrua através da sua leitura. Toma o seu tempo,
e ele mesmo é detentor de tempos os mais diversos e sagrados... Mas, o que é
que você faz do seu tempo se não está lendo e aprendendo? Se entregando a um
monte de prazeres “carnais” que te matarão mais cedo... Ler é um prazer vital,
espiritual no melhor sentido dessa palavra. Ler é um ato criador e co-criador.
O livro possuí poder, e ele concede este poder a quem o abre e lê em profundidade.
Numa necessidade rápida, até podemos
contar com um trago de águas quase podres, mas para a vida, para beber água
viva, o livro é o único lugar onde nos encontraremos com a civilização, com o
melhor dela. É por isso que eu e reafirmo: “eu acredito no Livro!” E em Deus?! “Ele
está nas entrelinhas...”
E se esse texto te pareceu difícil,
é sinal que está intoxicado por águas rasas... Corra urgentemente para a água
viva.
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