Hoje desejava escrever sobre várias
coisas. Eram tantas e várias coisas: as mulheres da minha vida, preconceitos
sociais, inteligências artificiais, guerras, desemprego, fome... Entre tantos
assuntos tais, um não me deixou o coração, a fé e a esperança. Peço licença ao
meu grande amigo que aniversariou nesta semana, pois foi em minha mensagem por
seu natalício que o assunto surgiu em minha mente. Ele fez sessenta anos, e
atualmente essa data se assemelha aos dezoito, pois se tornou um momento de
passagem. Não sei se me perdoará por publicar meus votos, mas vamos lá (o
perdão deverá ser outro texto):
A vida não é uma grande
vela acesa que vai queimando aos poucos e se apaga. Se fosse uma boa metáfora
seriam muitas velas, algumas se consumindo todas, outras caindo, outras se
apagando, e ainda outras voltando a se acender. A vida é uma miríade de velas,
e são muitas para que não se apaguem todas de uma vez.
A fé e a esperança não são
apenas uma desculpa para alcançarmos o futuro, elas o engendram e forjam (...)”
Os sentimentos ali em cima colocados
me inspiraram a reflexão. A fé e a esperança são ferramentas. As ferramentas
servem para realizarmos tarefas e trabalhos, possibilitam coisas que sem elas
seriam impossíveis e facilitam as nossas vidas (quando não complicam).
A fé
está intrinsecamente ligada às práticas religiosas, mas o está mais por método
do que por necessidade. Se aliar a uma “potência divina” para alcançar o que de
outro modo parece inalcançável é uma boa forma – prática – de dar substância ao
que se acredita. Então podemos aliar Deus à fé, todavia, para a existência
desta ele não é necessário. A fé é um sentimento. E ele se expressa através de
uma forte crença de que conseguirá atingir um determinado objetivo (seja
material, instrucional ou espiritual). Interessante notar que, como dito mais
acima, “são ferramentas ... formadas por nada que seja tangível, um vazio...”.
Não há nada que dê substância, materialidade ou real plausibilidade para este
sentimento.
A fé é a expressão ativa da vontade. É um querer ativo. É uma certeza que mobiliza energia, foco e intensidade sem iguais, aplicada a diversas ações e atitudes no cotidiano que levarão fatalmente à realização do que se acredita. Não há motivo plausível para que o indivíduo tenha ou sustente este sentimento, exceto o seu desejo. Ele pode alavancá-lo com um “deus” ou vários, pode até mesmo preenchê-lo de uma ideologia política, ou simplesmente - como foi o meu caso - contentar-se em ter seu próprio piano. O que nos faz perceber que é um sentimento que não se define apenas por causas extremamentes nobres. É importante notar que ele mobiliza sua energia e recursos internos para se colocar em movimento a fim de materializar seu desejo e transformá-lo em conquista, em realidade. Deve-se ter a noção clara de que nosso espírito não tem o hábito de mobilizar este sentimento para coisas obviamente impossíveis. Podemos até fingir por um tempo que cremos no impossível, entretanto, não passará de falácia vazia, mais vazia do que a substância da fé e da esperança.
A esperança
é um sentimento, para alguns, parecido com a fé. Entretanto eles não são
sinônimos. Ela é constituída por uma base sólida de experiências pessoais e
sociais que garantem ao indivíduo – ou coletividade – que tal ou qual fato
acontecerá, não importando quão distante esteja no futuro. Inclusive não importando
se o individuo que tenha esperança esteja no futuro onde ela se realizará. Por
isso a esperança é um sentimento individual, mas com forte raiz no coletivo. As
aspirações de um refletem as aspirações de muitos.
Diferentemente
da fé, a esperança se traduz por constância e densidade quase exasperantes. A
esperança é prima-irmã da paciência. Se a fé pode nos parecer um rio de fortes corredeiras
abrindo seu caminho sobre a terra, a esperança, por sua vez é o lençol
freático; formado por muitas chuvas filtradas pelo solo. Assim, repousa no
subterrâneo do mundo, no subterrâneo das ações. A esperança quando se
movimenta, o faz de forma extremamente lenta. Entretanto, ela é o solo no qual
a fé pisa firmemente e age em busca da sua autorealização, levando, assim, à
realização coletiva.
Estes sentimentos, que existem sem
substância real, preenchem o tempo presente, instauram o que virá a ser o tempo
futuro; e recontam o passado para ainda mais se insuflarem de certezas. E seu único motor, sua única razão de
ser, é a vontade do indivíduo
insuflada pela expressão do coletivo.
No meu livro Noite Escura um dos capítulos centrais, e que transformarão e
levarão toda a narrativa para o fim, chama-se justamente “A Esperança”. Naquela
obra a esperança foi forjada, era a promessa que um oficial de Roma fez a
soldados desertores – sem licença para tanto, mas com o desejo de consegui-lo:
o perdão dos seus crimes se prontamente deixassem as armas e trabalhassem pelo
bem comum. Ora, a deserção sempre foi punida com a morte, desde a antiguidade
até os dias atuais. Se você só tem a morte pela frente nada lhe resta, mas se te
acenam com a vida, tudo se ilumina e a esperança alicerça a sua fé de que
outras coisas se alcançarão. O futuro passa a ter substância.
Então, nessa junção de fé e
esperança conseguimos fundamentar e mobilizar energia e disposição para
alcançar objetivos. Reafirmo que elas são cheias de “vazio”: a esperança só é
possível pela percepção social de que não são infundadas; continua sendo
preenchida por vazio, pois não há garantias. Nem para uma e nem para outra, não
há garantias. A Esperança exige possibilidade, a fé exige atividade, não se
realizam em separado. São muito parecidas, mas diferentes. “O futuro fica repleto de sonhos e maravilhas que serão alcançadas por
nossas escolhas e ações” alicerçadas numa possibilidade social.
Voltado ao início deste texto, após
sessenta anos bem vividos, a fé e a esperança levaram meu amigo a alcançar seu
desidério. E agora seria como se uma vela se apagasse? Seria o fim de tudo? O
que fazer com o longo caminho que resta a frente? Caminhar ou sentar-se sem
nada mais realizar?
A vida não é uma vela que você
acende, queima e se apaga. Isso é uma metáfora, mas se fosse uma boa metáfora,
a vida seria miríades de velas. Cada uma acesa por um motivo ou alguém
diferente, e cada uma se consumindo no seu tempo. Ás vezes uma se apagaria e outra
seria prontamente acesa, enquanto outras ainda estariam queimando. Somente um
vento muito forte para apagá-las todas.
Então, hoje, a minha mensagem é de
esperança e fé. Munam-se de vontade, só ela pode mobilizar a fé. Queiram! Mas
queiram cheios de substância, queiram o que parece impossível, mas não é!
Queiram o que, se mobilizando e às demais pessoas e aos recursos disponíveis,
seja possível. A fé e a esperança não são feitos de Deus, nem preenchidas por
anjos, elas são sentimentos que podem vir a existir em você e que existindo
podem ser mobilizados para realizar seus objetivos. Mobilizando-os, pode ser
necessário ter um pouco de paciência. Entretanto, tudo se dobra a quem tem
esperança e fé.
Estes
sentimentos nos preenchem de força, energia, vitalidade e razão de ser. Eles
nos fazem levantar da cama todas as manhãs. Eles não nos escravizam, como os
patrões ou as contas, eles nos apontam o caminho da liberdade. E para lá nos
dirigimos altivamente e dispostos a lutar com garra e energia. Não somos uma
única vela a se queimar, mas milhares de velas ardendo ao mesmo tempo e que não
se apagam facilmente.
Muna-se de vontade. Apenas a vontade
pode fazer estes vazios que são a fé e a esperança se transformarem em forças
transformadoras e realizadoras. Amanhã será um bom dia, pois o seu desejo é de
que ele seja.
“Deus
abençoe as suas conquistas passadas, solta as amarras deste barco velho,
deixa-o ir embora. Agora você é uma criança nesse momento novo. Sorria,
desanuvia a sua fronte e explora esse mundo com alegria. Happy bird!” (Seja
feliz como um passarinho, livre, cantando pelas árvores... e fazendo safadezas
de passarinho)
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