Pular para o conteúdo principal

Postagens

Deus III - A sustentação essencial. O que é real? O que é realidade?

  Não dá para ilustrar este texto de forma adequada                 Há muito tempo atrás se alguém discutisse a realidade concreta das coisas e do cotidiano eu mandaria a pessoa “catar coquinhos”. Entretanto as experiências existenciais nos ensinam se permitimos. O tempo passou e tive vários aprendizados que considero importantes. Eles ajudaram a definir minha relação com o mundo e as pessoas. Nestas experiências, e vivências, passei a lidar com um real que é tênue. Perigosamente tênue. O risco de lidar com uma compreensão expandida do real e da realidade é perder o vínculo que torna as coisas entre nós inteligíveis e aceitáveis. Entretanto, não há nenhum caminho, místico ou não, que não passe pela discussão daquilo que nos parece óbvio, e obviamente verdadeiro, irretocável e irrevogável. Então, hoje vou refletir sobre a realidade física e social, vamos desmaterializá-la para só então, falarmos de imaginação. Mas usaremos a imaginação o tempo todo como método para essa discussão.  

Deus II - A dança: Som e fúria

O sagrado pode se manifestar no cotidiano              De todas as coisas sensórias que me envolveram desde sempre o som é uma das mais fascinantes. Trago grudado ao espírito o canto da pomba “fogo apagou” envolto pelo silêncio da fazenda, ambientando a solitude do jovenzinho que sentava-se na improvisada jardineira da avó e olhava longamente para o campo. De um lado o pasto a perder de vista e de outro o cafezal assentado no morro. De um pouco mais distante vinha o som do vento assoprando forte nos eucaliptos, só quem ouviu esta melodia que rasteja pelos ouvidos e dá profunda paz sabe como é a música e o perfume que juntos vem e quando junto deles estamos ainda toma nossa pele a sombra fresca do “calipial”.             Trago no espírito meu pai assoviando. Era um tempo onde os homens assoviavam, e fazer disso uma arte também era parte do seu quinhão. Só com o tempo eu saberia que o som nos afeta fisicamente antes de nos afetar o espírito. O som toca o nosso ouvido, toca fisicament

A Solidão no Tempo

  Sempre restará o Crochê              Das diversas solidões que existem uma é mais comum a todos nós, ou será: a Solidão no Tempo. Em outras palavras, sobreviver a quase todo mundo da sua geração e ao mesmo tempo ter mudado de lugar ou visto as coisas se transformarem completamente. Essa solidão é inexorável, só não ocorrerá se você morrer antes.             Em meu prédio há uma senhorinha (digo-o assim, pois é carinhoso) que tem provectos 98 anos. Ela caminha muito bem e sai todos os dias para dar uma agitada volta no quarteirão imenso no qual moramos. E sempre a encontro no meu passeio com os pinschers. De longe já vou cumprimentando-a e dando “dois dedos de prosa”, vejo-a com alegria e simpatia.   Já segredou a todos que me adora, pois segundo ela, “ele não tem vergonha de falar comigo na rua”. Meu coração despedaça cada vez que ouço algo assim. Faço questão de cumprimentar e falar com ela quanto posso, pois compreendo a solidão. Racionalizo o que sofre, mas não consigo saber o

A solidão é desumana

  O Pensador, Auguste Rodin              Solidão todo mundo sabe o que é. Alguns que a veem como algo positivo a chamam de solitude. Em termos simples a solidão é a ato de estar só. Fisicamente só é a primeira circunstância deste fato. Pode-se estar nesta situação porque é alguém que cuida de um farol numa ilha deserta ou se é um caseiro viúvo - sem filhos - que cuida de uma chácara.   Essas circunstâncias são menos comuns. A solidão é tanto mais suportável quando se sabe que ela terá um fim. Fica o preso na cela “solitária” sofre, mas sabe que sairá de lá. Então, ser solitário e ter esperança faz uma grande diferença no que o indivíduo sente. Até na prisão a solidão é castigo.             Entretanto, precisamos distinguir entre solidão e isolamento. As pessoas isolam-se - ou são isoladas - por diversos motivos, e algumas o fazem para estarem sozinhas. Apesar de dizerem que somos animais sociais, gregários, é bastante comum que busquemos momentos para ficarmos sós. Estes momentos pod

Deus - I O Devorador

  Deus me seduzindo            Esse não é um texto para relembrar o passado, mas uma tentativa de descrever o que não pode ser descrito.  Vou meter-me a falar do que não sei. Talvez seja exatamente assim, conhecemos muito e desconhecemos muito mais aquilo que realmente é importante. É como mãe, amamos muito mas às vezes nos damos conta do quão pouco a conhecemos. Entretanto, Deus, como o conheço, foi definido magistralmente pelo poeta indiano Rabindranath Tagore: “Sou um poeta e meu Deus só pode ser um Deus de poetas”. Então, só quem vive profundamente o ser poeta consegue traduzir em si o que isto significa.             Por aproximação tentarei dizer um pouco sobre isso. Uma definição destas não aparece em nosso coração na infância ou na puberdade, surge apenas quando ocorre um amadurecimento íntimo, que não tem idade para ocorrer. Podemos ter uma epifania em algum momento, mas ela só se consolida ao longo do tempo através de outros momentos assim. É como um “dejavu” não tem importâ

De pés descalços

  Hoje de manhã saí para passear com meus pinschers, e para minha surpresa, eu que nunca saio de chinelos, saí e um deles se rompeu. Vi-me na constrangedora situação de um pé calçado e outro não. Estava exatamente em frente a uma lixeira. Não tive a menor dúvida, tirei meu chinelos com carinho. Afinal era uma edição única da Havaianas, branca com tiras douradas, dez anos de parceria. Deixei-as com dó imaginando a galhofa dos lixeiros diante do objeto inusitado. E agora? Andaria descalço pelo chão sujo do centro da cidade? Bem, decidi que não existe chão limpo. Diante de 50 metros para voltar atrás e 500 metros para seguir adiante optei por seguir. Hão de concordar que trata-se de uma verdadeira aventura, pois exige coragem diante do novo   fui andando devagar para não machucar os pés diante das irregularidades do chão.   Foi bom, pois parecia uma massagem necessária e da qual eu não havia me dado conta. Logo um estranho sentimento de liberdade me invadiu. De pés colocados no ch

É preciso leveza em nossas relações. Pelo fim do autoritarismo cotidiano.

Assédio moral é autoritarismo              Há muitos anos atrás, quando eu era um estudante de História, ouvi dizer que o Brasil era um país autoritário. Que o brasileiro era um povo muito autoritário, e que isso se devia à nossa triste tradição escravocrata. Naquela época fui contra, pois para todos os lados que eu olhava não via nada disso.   O “brasileiro” - este conceito estranho que envolve milhões de pessoas num país de dimensões continentais, parece-me mais do que um atributo de identidade nacional um artifício de linguagem para dizer “nós”-, parecia-me tudo, menos autoritário.             Fui criado com as idéias de que “nós” somos cordiais, afáveis, gentis, alegres, festivos, sorridentes, persistentes, fortes e batalhadores. Alguma coisa disso devemos ser. Então onde é que estava o tal do autoritarismo? Provavelmente nos primeiros quatrocentos anos de História do Brasil. Porém, quatrocentos anos são quatrocentos anos. Uma pequena população aprendeu a serem donos e donas de