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Mostrando postagens de 2013

Conto de Natal

                  Era noite, noite silenciosa , e ela estava escura e fria. Um vento gelado batia pelas faces dos transeuntes. Garoava. A chuva fina molhava o asfalto que, brilhante e negro, refletia como um espelho as luzes dos enfeites de Natal. Brilhavam os vermelhos e verdes de semáforos, faróis amarelos dos carros, luzes azuis das lampadinhas, brilhos encantadores e sombrios. As pessoas caminhavam agitadas e com pressa pela estranhamente iluminada, e escura, avenida de São Paulo, a mais conhecida, a mais querida. Uns escondiam-se sob guarda-chuvas, outros enfrentavam a triste garoa desabridamente. Algumas pessoas paravam diante dos enfeites natalinos para tirarem fotografias entre risos alegres e banais. A garoa não importava tanto, ela apenas emprestava mais reflexos, mais luz e um ar triste e melancólico àquela noite.                 Em contraste, as ruas paralelas pareciam ficar ainda mais escuras. E, se parecia seguro passear pela grande avenida, caminhava-se um pouc

Marcas

No deserto dentro de mim há uma trilha de pegadas. Não sei de onde vieram e nem para onde vão. As direções se confundem neste horizonte árido e vazio. Sei quem as deixou, mas não sei quem é...Passou como um peregrino em busca de alguma coisa, fazendo uma jornada qualquer. E incauto deixou suas marcas em mim. Eu as miro, e suspiro... Olho-as, e satisfeito tenho-as por companhia. Até que o vento pouco a pouco as apague. Peregrinos não têm culpa por seus pés repousarem delicados e macios na fina camada de areia. E nem esta por lhes guardar a lembrança. Sopra ligeiro vento, sopra ligeiro! Deixa-me guardar apenas por um instante, essa imagem que se desfaz, pois a aridez da minha paisagem não combina com marcas em vão.

O que eu quero?

Alguém que me ame, ao invés de fazer “sexo”. E esteja comigo, e não numa “performance pornô”.   E que goze, e não tenha “orgasmos”. E que durma abraçadinho e não “de conchinha”. Que converse, e não “discuta a relação”. E que seja um mero trabalhador, e não um “profissional” realizando uma “carreira”. E que seja jovem, e não um “teenager”, “adolescente” ou “mlk”. Que não tire fotografias, mas que se lembre de mim. Que não me mande “torpedos”, mas flores. E quando estivermos cansados, que descansemos, e não tiremos “férias”. E se tivermos dificuldades, que sejam problemas e não “diagnósticos psicológicos”.   Quando estivermos tristes, estejamos tristes e não “depressivos”. Quero alguém que esteja vivo, e não procurando se enquadrar em “categorias científicas”; querendo quem concorde com o seu diagnóstico. E se por isso eu ficar bravo, zangado mesmo, e em seguida ficar bem e feliz, que não diga que sou “bipolar”, mas imprevisível, de lua, de veneta. E se eu não for bom de c

Há os que têm filhos e há os que têm uma obra

Conversando com um querido amigo percebi que uma de minhas dificuldades não era tão egoisticamente minha. Ele se perguntava o que fazer nesta altura da vida (depois dos cinquenta) quando você não teve filhos. Olhava para o passado, e mesmo sem querer parecer desanimado, carregava sobre os ombros todo o peso de uma sociedade que desenha o tempo todo o que é o homem ideal, o ser humano ideal. Bem... Nem todos nós nascemos para ser estes seres humanos ideais – talvez ninguém. Bem, eu não tive filhos, e até onde sei não os terei. Nada contra, só não os tive. E acho que um monte de homens e mulheres da minha geração não os teve. Talvez por que estávamos cheios de sonhos diferentes depois de séculos de conformismo social e cultural. Alguns se casaram muito tarde, outros apenas juntaram os trapinhos... tantas vezes o fizeram que poderiam abrir uma loja de retalhos. Mas isso não importa. Queríamos algo diferente, uma vida diferente, e a experimentamos, sem medo, com medo, entre sustos e

A Cavalera e Eu - Como começou minha Coleção Cavalera (e V-Rom).

              Este texto é para matar uma curiosidade que muitos têm. Sempre alguém me pergunta: “Você é garoto propaganda da Cavalera?” “A Cavalera te patrocina?” “Por que você lançou livro na Cavalera?” Bem... aí vai.                 Quando se conhece o meu trabalho e currículo parece ser improvável que eu me envolva com moda ou que faça uma coleção de peças da Cavalera. Sou escritor e historiador, e fiz mestrado e doutorado em Multimeios na àrea de Cinema (Unicamp). Minha formação teve ênfase em História das Religiões e História da Arte. No doutorado escrevi uma tese sobre a adaptação da vida de Jesus Cristo para o Cinema e até os dias atuais minhas pesquisas giram em torno de Cinema e Religião. Em, 1999, lancei meu primeiro livro “Maria de Deus”, no qual lidava com terceira idade, sexualidade e religião. Há pouco tempo, em 2010, lancei o livro “Filmes de Cristo. Oito aproximações”, um trabalho acadêmico ligado à Teologia e Cinema. E em 2013 lancei “Memória Impura”, repleto de

As narrativas de Si nas Redes Sociais

Gosto da distinção entre autor e narrador.   A pessoa que escreve não é o narrador, o escritor alinhava um conjunto de técnicas e estabelece a narração e o narrador. A pessoa do escritor não é o narrador.   Quanto mais tempo fico na internet e nas redes sociais, mais concordo com esta definição. Vejo narradores todos os dias. Mesmo aqueles que não têm consciência deste processo estabelecem narradores, e por sua vez personagens. Muitos de nós entramos numa rede social, ávidos por pessoas e encontramos narradores. Narradores de si. Construindo personagens, ilustrando-as, glamurizando-as ou se detratando em público.   Seres discursivos, um texto, um discurso para cada ocasião. E, como escritor, confesso que nunca vi tanta gente àvida por leitores. E os discursos se constroem com partes do cotidiano, ou melhor, da interpretação do cotidiano, e há aqueles que introduzem neles o merchandising, se localizam nos lugares, fotografam os pratos, os parques, os papos... Em meu cotidiano

O objeto livro, amigo de todas as horas

Não sou um saudosista, e sempre fui dos que saudaram a literatura virtual e digital, no entanto, jamais fui pelo fim do objeto livro. Quem lê sabe que há muita coisa boa e interessante neste amigo que nos acompanha ao longo dos anos. Quem nunca cheirou um livro? Quem nunca apertou contra o peito aquele livro de poesia que nos enchia de sentimentos novos ou que traduzia à perfeição aquilo que não diríamos a nós mesmos por falta de força na expressão? Sou muito tátil e muito sensorial, então, ainda me lembro do cheiro dos gibis dos anos setenta, cheiro ácido e áspero, e também do catálogo da Avon, cujo cheirinho fazia a minha delícia infantil. Ainda bem que os livros melhoraram de qualidade e há muitos hoje que cheiram catálogo da Avon, rs. Mas quem não sabe o que é o delicioso cheirinho de um livro antigo? Aquele de onde a acidez da tinta nova já desnaturou e sobrou apenas um delicado perfume adocicado? É, o livro tem muito mais coisas do que informação... Agora tentem cheirar um

A Luz não sabe que ilumina, pois desconhe as trevas...

            Há muito tempo atrás inspirado por um rompante romântico num poema escrevi: “Como é que se diz para a Luz que ela ilumina? Ela não sabe que ilumina, exatamente por ser luz... Como se diz que a sua simples presença desvela toda a beleza? Como se diz que sem ela as cores não podem ser vistas? que os nuances não existiriam.... Que tudo o que se faz....sem sua presença jamais existiria? Como se diz para a Luz que ela ilumina...se por ser luz ela desconhece as trevas...”               A poesia tem essa capacidade de desvelar e revelar algumas verdades eternas e cuja reflexão nos toma pelas mãos e instaura possibilidades e realidades. Algumas frases são metáforas, são sugestivas muito mais que afirmativas, não querem ser tomadas por verdades, querem apenas sugeri-las.             Hoje, enquanto eu atravessava uma catraca do Metrô este poema, décadas depois, voltou-me a mente.             Entre instalar o bi

Noite Escura, um livro de Aventura - será publicado

Um livro de aventura? Ah, sou daqueles que tiveram a felicidade de ler um bom livro de aventuras quando jovem (bem, ainda sou jovem rs.). Guardo com muito carinho em minha memória estórias que me seguem e seguirão por toda a vida. Quem não se lembra de “Os Três Mosqueteiros”, “A Ilha do Tesouro”, “Moby Dick”, “Robson Crusoé”, “Simbad, o Marujo”, “Os Irmãos Corsos”? E tantos outros. Uma literatura apaixonante. Por trás das estórias sempre estavam envolvidos valores que para mim são verdadeiros: amizade, coragem, família, caráter, etc. Eram o que se chamava antigamente de “livros para meninos”. Muitos deles chegavam em nossas mãos, como até hoje, em versões simplificadas, afinal, quem leu “Moby Dick” sabe que aquilo é muito mais do que uma simples caça a uma baleia branca malvada. Afinal, o escritor é Hermann Melville, um dos gigantes da literatura universal. Foi revestido por este espírito, de escrever um bom livro de aventura e que fosse muito mais do que uma simples ave

Falar sobre o Amor...

Falar sobre o Amor apenas nos deixa distantes dele... Dizer o que é o Amor só nos faz desconhecê-lo... Há quem ame a definição de Amor mas não as pessoas, pois não cabem na definição... Amar é algo bom que acontece com os outros, comigo acontece Paixão. Não me preocupo com o Amor. Talvez ele já tenha acontecido na minha vida, talvez ele já tenha ido embora, talvez eu o viva neste momento... Como quem ama se sente bem, devo estar amando e sendo amado... é a lógica, não é? Mas se não estou com ninguém, como é que se explica tanto Amor? Jogos de palavras, apenas isso, é o que são... E tem gente que perde tempo acreditando em seus próprios discursos. É como sempre digo: a perfeição existe. É só me dar parâmetros que eu digo se é perfeito ou não. O Amor existe, mas é como disco voador... Muitas testemunhas, poucas provas e muita imaginação. Mas não se preocupe, se você é daqueles que acredita, existem pessoas que foram até mesmo abduzidas... por que não?! Não é

Moema virou fumaça

Um dos bairros mais cantados e decantados da alvissareira cidade de São Paulo está com os dias contados. Logo irá virar (se já não virou) peça de marketing imobiliário. Moema é um dos bairros mais caros de São Paulo e se tornou assim por ser considerado um lugar com ótima qualidade de vida. Moro aqui há sete longos anos, por isso sinto-me à vontade para criticar e elogiar. Aqui quando chamamos a polícia ela vem, isso quando já não está por aqui. Assalto a mão armada? Nunca vi, nem notícia. Mendigos? Apenas duas famílias que só vêm aos sábados na Porta do Pão de Açúcar ( e creio que trabalham durante a semana). Antigamente a maior preocupação no bairro era andar olhando para o chão, pois sempre tinha bosta de cachorro. Havia uma praga também, passarinhos e mais passarinhos que teimavam em acordar os moradores pouco depois das cinco da manhã. Outra vantagem é que aqui existe uma agência bancária a cada quarteirão e meio, se é que chega a tanto. Tudo o que você deseja tem no bairro